O COMPLEXO DA ILUMINAÇÃO



Um dos momentos mais delicados que surgem quando se começa a ter uma nova percepção de mundo, ou seja, no momento em que o famoso despertar espiritual desponta, é deparar-nos com a famoso, porém quase nunca diagnosticado, Complexo da Iluminação.

É semelhante ao Complexo de Messias, em que o ser acredita estar destinado a ser um salvador de algo ou alguém, que veio com uma missão que só ele pode executar. Apesar da semelhança, o Complexo da Iluminação funciona de forma um pouco diferente. O ser, quando atingido por esse complexo, entra na ilusão de que, por começar a conhecer a realidade multidimensional extrafísica, se vê na posição de Iluminado, daquele que vai converter os amigos, a família, o mundo, a fim de desfrutarem com ele toda a alegria que só quem já se sentiu completamente conectado ao Universo conhece. 

É absolutamente maravilhoso quando começamos a perceber que não estamos sozinhos nessa realidade, que as possibilidades são infinitas e tudo o que compõe a nossa vida está perfeita e milimetricamente arquitetado para nos fazer melhorar e evoluir como seres imortais que somos. 
Que a meditação, a habilidade de se manifestar em outra dimensão (como na projeção da consciência durante o sono) são dádivas maravilhosas e exclusivas do espiritualismo em geral.

O problema começa quando, de tão deslumbrados por essa nova realidade, sentimos o dever de fazer os outros seguirem o mesmo caminho que o nosso, começamos a nos isolar em um mundo interno de ilusão onde nos visualizamos como grandes escolhidos e ascensionados, nos afastamos de quem não tem exatamente a mesma visão de mundo que a nossa. Podemos deixar de sentir prazer nos afazeres do dia a dia, sonhando acordados com o momento da libertação da carne, da volta pra casa, divagando sobre quem foi quem em nossas existências passadas, etc.

Tendemos a pensar que, ao mudarmos o externo, estaremos mudando nosso interior, corrigindo nossas imperfeições, evoluindo. O caminho é exatamente o oposto. Pare e pense: por acaso você voltou a habitar a dimensão física crescendo em montanhas tibetanas? Ou uma aldeia indígena pré colonial? Observe o meio em que você nasceu, os amigos que te cercam, as áreas de interesse que mais te agradam. Todas essas condições e informações são pistas do que você precisa enfrentar para aprender e evoluir gradativamente. 

As situações adversas estão aí justamente para nos testar, para ver se conseguimos manter a calma e até aplicar as técnicas de respiração quando estamos presos no trânsito, ou quando o garçom demora a trazer o pedido. Se nos seguramos da tentação de atacar outras ideologias políticas com palavras negativas de revolta e ódio, se somos honestos quando faltamos ao trabalho inventando uma desculpa qualquer.

Obviamente, é sempre bom passarmos um tempo sozinhos, tentarmos manter a atitude positiva no dia a dia, compartilhar com aqueles que nos rodeiam a alegria que sentimos ao experimentar a conexão conosco e com o Universo, mas não devemos nos isolar nessas sensações e adotar uma postura dogmática e intolerante para com os que não pensam e sentem da mesma forma que nós. 

Intolerante? Você pode pensar. Como algo tão belo quanto a serenidade que os ensinamentos espirituais trazem podem se transformar em intolerância? É só olhar para a história. O que era pra ser um discurso de paz e união (amar o próximo como a si mesmo, por exemplo) se transformou em justificativa para matar e condenar - Cruzadas, Inquisição e afins - quem tem uma perspectiva diferente sobre os ensinamentos deixados. E assim por diante.

É como o excelente texto de Mooji diz: "Sempre esteja consciente ao se sentir superior.
A noção de que você é superior é a maior indicação de que você está em uma armadilha egóica. O ego adora entrar pela porta de trás. Ele vai pegar uma ideia nobre, como começar yoga e, então, distorce-la para servir o seu objetivo ao fazer você se sentir superior aos outros; você começará a menosprezar aqueles que não estão seguindo o seu “caminho espiritual certo”.

Ao deixarmos o Complexo da Iluminação nos atingir, estaremos, mesmo que inconscientemente, nos sentindo superiores aos que não sentem o mesmo que nós. Começaremos a nos colocar em posição de iluminados, evoluídos, especiais. E não é assim que funciona. Todos são especiais. Estamos em uma grande família, e cada caminho, de alguma forma, acaba levando à luz, mais cedo ou mais tarde, seja por cumprimento das leis de amor, seja através das lições que a dor nos traz. 

Aplique o que você acredita, continue com seus estudos sobre a espiritualidade, exerça o autoconhecimento. Sobretudo, tenha a consciência de que vislumbrar o início do caminho não é 
ter chegado ao final dele. 

Você não precisa ser mestre de ninguém além de si mesmo.

Comentários

  1. Fantástica colocação! Nunca tinha levado isso em consideração e já me peguei nessa situação muitas vezes. Obrigado por me ajudar a ser uma pessoa mais evoluída sem soberba espiritual.

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    1. Obrigada por comentar, amigo!
      Essa é uma situação que ocorre com muitos durante o Despertar Espiritual, não se sinta mal por isso. O mais importante é ser consciente do processo a fim de que o ego não nos domine inteiramente. Namastê! ♡

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  2. Obrigado, querida (o) de coração mesmo adorei ler os textos !

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